quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Procura-se um Zé

Replico, na íntegra,publicado originalmente no Blog doTorero o especial texto de José Roberto Torero , colunista da Folha de São Paulo que trata de uma forma, ao mesmo tempo, humorística e séria, tendo como pano de fundo o contexto do futebol, a banalização dos nomes. Podemos estender a qualquer área de nossa sociedade e o fato, provavelmente se repetirá. Não o publico, digamos, em causa própria, por me chamar José, mas por ser uma sacada genial.
Degustem!

Procura-se um Zé

José Roberto Torero
São Paulo, 01 de setembro de 2009

Outrora comuns, Josés são escassos no Brasileiro
e perdem protagonismo para nomes como William


CARO JOÃO, caríssima Maria, eu vos pergunto: Qual o nome mais comum entre os jogadores do Campeonato Brasileiro? José, certo? Errado. Totalmente errado. Os Zés hoje são uma raridade. Pelo menos no futebol.

Para ter certeza disso, fui ver como são chamados todos jogadores de todos os 20 times. São mais de 600 atletas, e entre estes encontrei apenas três zés: Zé Luís, do São Paulo, Zé Roberto, do Flamengo, e um cândido Zé, sem nenhum acompanhamento, que joga no Sport. Isso significa menos de 0,5%. Até no Esporte da Folha há mais Josés, como eu, o Geraldo Couto, o Carlos Kfouri e o Henrique Mariante.

Antigamente todo time tinha pelo menos um Zé. Ele podia vir acompanhado de outro nome, de um apelido, no diminutivo ou no aumentativo, mas toda escalação tinha um Zé. Tanto que, fazendo um pequeno esforço de memória, rapidamente consegui fazer uma seleção de Zés.

Ela começaria com o goleiro Zé Carlos, do Flamengo (com Zecão, da Portuguesa, na reserva). Na lateral direita, teríamos o Super Zé, que era o apelido de Zé Maria, do Corinthians (na reserva, os tricolores Zé Carlos e Zé Teodoro). Na zaga, Zé Eduardo, o viril zagueiro corintiano, e Zé Augusto, daquele célebre time do Bahia que tinha Sapatão, Baiaco e Beijoca. Na lateral esquerda, fiquei em dúvida entre Zé Carlos Cabeleira, do Santos, e Zeca, do Palmeiras. O meio de campo seria uma moleza: teríamos Zé Mário, do Vasco, o excelente Zé Carlos, do Cruzeiro e do Guarani, e Zé Roberto, talvez o melhor jogador da história do Coritiba. Na reserva, outros Zés, como o Elias, o do Carmo e o Renato. O ponta direita seria Zequinha, ex-Botafogo e São Paulo, o centroavante poderia ser o veloz Zé Alcino, que jogou pelo Grêmio com Paulo Nunes, e na ponta esquerda entraria Zé Sérgio, campeão paulista pelo Santos em 1984. Para técnico, há uma infinidade de opções, mas fico com Zezé Moreira, que é zé duas vezes. O árbitro? José Roberto Wright. O narrador? José Silvério, é claro.

O nome José era o símbolo do homem comum. Hoje, ironicamente, são artigos de luxo. Se Drummond escrevesse seu célebre poema por estes dias, teria que chamá-lo de "E agora, William?".

Acredito que esta escassez de zés ocorre por dois motivos. O primeiro é que as famílias de classe baixa há algum tempo vêm demonstrando uma inclinação por nomes estrangeiros. O José tornou-se um sinônimo de simplicidade, até de pobreza, e parece que querem mascarar estas coisas colocando alguns dablius no começo dos nomes e terminá-los com "son", o que sempre dá um ar americano. O segundo motivo é que os próprios jogadores tentam evitar o Zé.

Talvez acreditem que é um nome de pouco apelo mercadológico. Por exemplo, Kleberson, do Flamengo, é José Kleberson, mas preferiu ficar só com o segundo nome. E o artilheiro do Náutico chama-se José Carlos, mas preferiu trocar o José por Bala e virou Carlinhos Bala.

Enfim, atualmente ninguém aceita ser mais um José, ninguém quer ser considerado um simples Zé. Hoje em dia todo mundo é diferente. Todo mundo é William.

torero@uol.com.br

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